

Entre os dias 24 e 26 de novembro a Rede Fluminense de Núcleos de Pesquisa de Gênero, Sexualidade e Feminismos nas Ciências Sociais promoverá a quarta edição do seu encontro anual. A programação completa do evento pode ser consultada no site da rede. O LabGen-UFF organiza, junto com o LABUTA-UFRRJ a mesa “Pandemia e novos caminhos teóricos, epistemológicos e metodológicos dos estudos de gênero”. As inscrições podem ser realizadas via formulário, havendo emissão de certificado.
Leia mais sobre a mesa:
Mesa 2: Pandemia e novos caminhos teóricos, epistemológicos e metodológicos dos estudos de gênero
O cenário pandêmico colocou o tema do cuidado no centro do debate e explicitou questões apontadas historicamente pelos estudos de gênero, como a interdependência entre as esferas pública e privada da vida social. A sobrecarga de trabalho das mulheres, por sua vez, reacendeu demandas por políticas de equidade nas instituições em que pesquisamos. O confinamento prolongado trouxe limitações concretas ao desenvolvimento das pesquisas empíricas, que passaram a redelinear os modos de ir a campo, fazer entrevistas e construir dados.
De modo geral, o contexto favoreceu a visibilização da produção dos estudos de gênero ao mesmo tempo em que tornou mais porosas as fronteiras entre experiências pessoais e produção científica. Com efeito, a pandemia acentuou e tornou mais visíveis algumas tendências já existentes em anos recentes no campo de estudos de gênero e no campo das ciências humanas, em geral.
Em 2012 a socióloga Liesbet van Zoonen criou o termo “i-pistemology” – em português “eu-pistemologia” – para falar do “processo cultural contemporâneo em que pessoas das mais diversas origens passaram a suspeitar do conhecimento vindo das instituições oficiais e dos experts, substituindo-o por verdades vindas de suas próprias opiniões e experiências individuais”.
Para Liesbet, o fenômeno se caracteriza pela ideia de que a verdade está no eu, nas experiências pessoais, na memória individual, na subjetividade e que a verdade pode ser conhecida de forma supostamente direta e não mediada. Trata-se ainda de supor que cada indivíduo detém uma verdade pessoal diferente e que não há formas de arbitrar quais afirmações estão mais próximas ou afastadas da realidade.
Tais tendências, presentes tanto nos diversos negacionismos como em algumas correntes teóricas no interior das próprias ciências humanas, preocupam sociólogas como Patricia Hill Collins desde pelo menos a década de 1990. A autora da “standpoint theory”, conhecida pela valorização da experiência como fonte de teorização e pesquisa sociológica, adverte há muito tempo que se a experiência é um ponto de partida para levantar perguntas, formular hipóteses, nada deve dispensar os cientistas sociais de responder tais perguntas via procedimentos científicos rigorosos.
“Valorizar as narrativas individuais e a subjetividade humana ao ponto de apagar a estrutura social – uma tendência exemplificada pelo pós-modernismo extremo – parece terrivelmente perigoso. Como podemos falar de pobreza ou falta de moradia sem analisar estruturas sociais como entidades autônomas?”. (Hill Collins, 1998)
A sociologia do conhecimento demonstra que os indivíduos estão cotidianamente sujeitos ao viés de confirmação, isto é, à tendência de buscar ou interpretar informações de uma forma que reafirme suas crenças preexistentes, ignorando as evidências que as contrariam. Nesse sentido, a ciência nos obriga a prestar atenção naquilo que ignoramos ou que não queremos ver, porque organiza as evidências de uma forma sistemática e nos faz olhar para elas, evitando conclusões prematuras e reconhecendo a incerteza, o limite do que se sabe. Assim, os protocolos científicos são formas de evitar a confirmação das crenças, via observação sistemática, hipótese nula, falseabilidade, objetividade, lógica e transparência.
Nas ciências humanas, levantamentos, entrevistas, estudos de caso, dados quantitativos devem ser organizados de uma forma que não podemos ignorar aquilo que nos contradiz. Tais protocolos conflitam radicalmente com a “eu-pistemologia”, pois se baseiam no entendimento que a experiência individual e a observação casual não são boas bases para um conhecimento mais acurado e melhor. Além disso, em vez de colocar a ênfase no “eu” e no indivíduo, a ciência pratica um tipo de conhecimento coletivo e comunitário, criando as condições institucionais para a exposição ao contraditório, à crítica e à constante revisão e reavaliação entre pares, entendendo que essa é a melhor maneira de reduzir vieses e aprimorar teorias e métodos.
No momento em que a área dos estudos de gênero e as ciências sociais sofrem ataques sistemáticos por agências de fomento e órgãos governamentais, as discussões sobre o caráter científico dos estudos de gênero se torna urgente. A presente mesa pretende refletir e discutir estas questões explorando os desafios, limites e tensões das práticas de pesquisa no campo dos estudos de gênero diante das mudanças intensas que atravessamos.

Nos últimos anos no Brasil, vários discursos sobre desigualdades começaram a circular em larga escala para múltiplos receptores e muito além do contexto em que foram originalmente criados. Um grande fluxo de informações de movimentos sociais como o feminismo, o movimento LGBTQ, o movimento negro e várias organizações da esquerda assumiu a mídia social, que conecta indivíduos através de grandes distâncias e impulsiona interações além de suas conexões físicas. Embora se presuma que tais redes reduzem as assimetrias de comunicação, elas são ambientes altamente estruturados e têm sua própria economia política. Plataformas como Facebook, Twitter, Youtube são projetadas para mineração de dados individuais e seu design tem um forte impacto na forma como as mensagens e interações sociais são modeladas. Outra razão é que os atores sociais não compartilham os mesmos códigos culturais, redes físicas, repertórios e condições objetivas de vida. A multidirecionalidade das mensagens on-line torna a recepção e decodificação de informações muito incertas. A pesquisa de Camila Garcia Fintelman investiga a recepção de discursos sobre política, gênero, raça e violência entre jovens de baixa renda de 20 a 30 anos de uma pequena cidade nos arredores do Rio de Janeiro. Ao realizar trabalho de campo e entrevistas semiestruturadas, procura entender como os discursos sobre política e desigualdades são recebidos, filtrados e interpretados pelos entrevistados do ponto de vista, da cultura local e da situação objetiva.
Resumo: Este trabalho baseou-se em entrevistas semiestruturadas com 14 jovens de 20 a 30 anos de Magé, região da baixada fluminense do Rio de Janeiro, visando analisar a recepção de mensagens políticas por pessoas de classes populares, a fim de testar a hipótese de que as redes sociais digitais produzem uma falsa horizontalidade entre os usuários. Os achados indicam que o distanciamento físico e a falta de redes dos jovens das classes baixas com pessoas universitárias e de esquerda fazem com que não compartilhem os códigos e enquadramentos do repertório progressista, o que, para além das consequências disso para a desigualdade, provoca uma série de consequências culturais e políticas. O trabalho sugere que, tendo em vista o atual contexto político, os setores progressistas adotem uma postura mais didática e pragmática na interlocução com pessoas de classes populares.
Acesse o texto da monografia.

Confira e faça download da monografia de graduação “Por dentro da socieducação: uma revisão sistemática de literatura“, de Mariana Albert Ferreira, produto de pesquisa no LabGen-UFF: “A presente pesquisa se propõe a realizar uma revisão de literatura sistemática sobre o sistema socioeducativo. A partir da coleta de 232 artigos com a utilização das palavras-chave medidas socioeducativas, sistema socioeducativo e adolescente em conflito com a lei, nas plataformas Google Scholar e Scielo, foram encontradas algumas brechas na literatura acerca do assunto pesquisado. De acordo com dados apresentados em gráficos e tabelas, pôde se perceber uma grande concentração de trabalhos em determinadas regiões do país. Para além de uma grande concentração de estudos, há também uma grande dificuldade na busca por informações acerca do sistema socioeducativo nos locais com poucas produções acadêmicas encontradas. O desencontro de informações explicitado na relação com os relatórios apresentados pelo governo demonstra um risco relacionado a pouca quantidade de pesquisas empíricas encontradas em algumas unidades federativas do país. Ressalta-se a importância da produção de pesquisas acerca do tema para o esclarecimento de ruídos comunicacionais existentes acerca do adolescente autor de ato infracional, além da possibilidade de averiguar as reais condições desta parcela da população que se encontra em restrição ou privação de liberdade”.

Resumo: Este ST tem como objetivo promover discussões epistemológicas e metodológicas acerca do processo de produção do conhecimento sobre movimentos sociais, participação, democracia e políticas públicas e assim contribuir para a ampliação da reflexividade, do rigor e da diversidade metodológica das pesquisas sobre esses temas. O ST acolhe trabalhos relacionados a métodos e técnicas de pesquisa aplicados às temáticas do evento, também incluindo estudos sobre seu uso em pesquisas não acadêmicas. Incentivamos o envio de artigos que apresentem diferentes enfoques, como discussões epistemológicas e éticas sobre pesquisa e conhecimento, apresentações e revisões de métodos e técnicas, relatos sobre sua operacionalização em experiências concretas de investigação, reflexões sobre o uso de novas tecnologias em pesquisas empíricas, debates sobre o uso social de dados e métodos, entre outros.
Inscreva seu trabalho e venha debater com a gente! https://www.pdpp2022.sinteseeventos.com.br/site/capa

Nesta próxima terça-feira, dia 07 de setembro, às 19h teremos a live de debate do livro ”Clássicas do pensamento social: Mulheres e feminismos no século XIX”, organizado por Bila Sorj e Verônica Toste Daflon, recém-lançado pela Editora Rosa dos Tempos.
Contaremos com as presenças de Bila Sorj (UFRJ), Mariana Chaguri (UNICAMP), Miriam Adelman (UFSC), Roberta Soromenho, Nicolete (USP) e Verônica Daflon (UFF). A mediação será feita pela Barbara Grillo.
A transmissão será ao vivo pelo YouTube nos canais do Labemus Laboratório e do Marxismo Feminista.
Dois exemplares dessa obra estão sendo sorteados no Instagram do Labemus.

A professora da Uerj/FFP Lolita Guerra participou do podcast Desmistificando a História apresentando sua pesquisa e discutindo as representações de sociedades descritas como matriarcais. Confira no Youtube.
